quarta-feira, 25 de julho de 2012

Não há fim se há meios

Quando moleque, jogando bola na rua, sempre brincávamos que se fosse para ser atropelado, próximo ao golzinho demarcado por tijolos de alguma construção inacabada, que Deus mandasse uma Mercedes esportiva e de última geração. Livrai-nos do Fusca, do Passat, da Belina, do Fiat 147, entre tantos outros velhinhos, hoje, porém, colecionáveis.  
Uma senhora da rua de cima sempre profetizava que gostaria de morrer antes da própria morte. Matreira, suas histórias margeavam a imaginação dos meninos, inclusive a minha, ao contar que gostaria de falecer no gozo da saúde plena. Assim como as divas do cinema dos anos 40, só que em cores.
A senhora sempre contava uma passagem com um burguês inglês que em pleno ato sexual se  apagou nos atributos físicos da amante. Subitamente, o médico adentrou ao palácio perguntando se o cliente conservava a consciência. Não, respondeu alguém. Ela saiu pela correndo pela porta dos fundos.   
Com o poder que só a escrita proporciona - e o papel interpreta -, transporto o tema para a  indústria gráfica. Pragmatismo de fora, há pessoas que acreditam piamente no fim do papel -  que, convenhamos, não seria o fim da impressão. Comprado por alguns, o discurso de que o papel está chegando ao fim provou-se não ser argumento para acabar com a indústria da impressão. Hoje, modernas impressoras trabalham com inéditos substratos, como vidro, PVC, lonas, plástico, cerâmica, entre outros que não recordo agora. Além do papel, teríamos uma  miríade de substratos. A consciência, então, estaria preservada.
No meio jornal as notícias passam distantes do ar fúnebre. A probabilidade de falência múltipla dos órgãos, orquestrada pelo fim do papel, está distante. O IVC informa que o segmento jornal apresentou crescimento de 2,3% no primeiro semestre de 2012.  Entre os meses de janeiro e junho, a média diária de circulação de todos os jornais filiados ao instituto foi a maior da história, atingindo a marca de 4.543.755 de exemplares. Ao comparar esses dados do IVC de junho de 2012 com os últimos 12 meses é possível observar um crescimento de 5,1% da circulação dos títulos populares (com preço inferior a R$ 0,99). A circulação dos jornais com preço de capa entre R$ 1 e R$ 2 teve um aumento de 2,5% nos últimos doze meses. O menor percentual de crescimento (0,8%) foi registrado na faixa dos títulos acima de R$ 2. Novamente, a consciência foi preservada.
Sergio D’Ávila, editor executivo da Folha de S.Paulo, lembrou durante evento para discutir o mercado de jornais, que sempre que há uma inovação tecnológica. “Mas as inovações tornam os jornais melhores. Quando surgiu o telégrafo, os jornais passaram a ter lead. Com o rádio, sumiram as edições vespertinas. A TV fez os jornais colocarem mais fotos na primeira página, já a TV colorida fez as páginas ficarem coloridas. Cada inovação teve uma leitura e fez uma transformação, mas eles foram seguindo. A internet talvez tenha gerado com uma velocidade maior esta atualização constante”, apontou.
Já o mercado de produtos de luxo – e a indústria gráfica, principalmente de embalagens, curte esse setor - registrou crescimento médio de 20% em 2011, totalizando vendas de R$ 18,8 bilhões. Estimativa da MCF, consultoria especializada nesse segmento, é de o crescimento na casa dos 20% pelos próximos três anos. O mercado de luxo, então, além da consciência preservada, investe em qualidade de vida. O papel é inerente ao meio, tenha certeza.  
Enquanto isso, naquela rua, a idosa continua sonhando com o instante derradeiro. Deseja  morrer com perfeita saúde, igual a um passarinho que se deita para dormir em seu aconchegante ninho. Por outro lado, desistira de esperar a data fatídica. Já se acostumou com a ideia de visitar permanentemente o céu sabe se lá quando.
Sentada em sua antiga poltrona de balanço, permeada por fibras de coqueiro legítimo,   lembra por um instante de quantas vezes o jornal lhe proporcionou notícias fresquinhas e manchetes arrasadoras na temível época da ditadura militar. Lembra ainda quantos livros saboreou debaixo de uma antiga jabuticabeira que filtra os raios solares de sua modesta casinha.
Foi por meio do papel e pelo incessante hábito da leitura que conheceu Dom Casmurro, teve raiva por alguns instantes do assassino da cachorra Baleia, em Vidas Secas, e molhou as páginas do livro Pássaros Feridos. Por muitas vezes viu o jornal antigo virar embalagem do excelente chouriço feito pelo seu Joaquim, do armazém ao lado de sua casa. Viu, reviu e continua a pensar em sua morte. Quando perguntada se acha que o papel caminha para o mesmo fim, é enfática: Sim, morrerá, assim que o ser humano deixar alugar o universo.
Indago: Quer dizer o Planeta Terra?
- Claro que não. Quero dizer universo mesmo, não sei quais são os meios de leitura dos extraterrestres.
Saudações Graphprintenses,
Fábio Sabbag  - Editor da GRAPHPRINT                  

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